sábado, janeiro 17, 2009

Saudades por uma mulher que não conheci


Morreu a Tereza Coelho. Cruzámo-nos nas redacções do "Público" e do "Independente" mas nunca a conheci bem. A notícia da sua morte foi, no entanto, um grande choque. Porque não tendo proximidade, admiro o que construiu na sua vida. A Tereza, além de bela, era discreta, inteligente e feminina. Era uma Mulher que se cumpriu plenamente. Que estúpido a morte levá-la assim... Tenho saudades dela e nunca a conheci verdadeiramente. Gostava da sua paixão pela Duras, dos textos que assinou anos a fio no "Público" e que revelavam a sua sensibilidade, o amor e o seu entendimento da diferença. Entre outras coisas, escreveu sobre mulheres e homens que ousavam amar de modo diferente. E amou dois grandes homens: o Eduardo Prado Coelho e o Rui Cardoso Martins. Que pena ter partido tão cedo, Tereza...
Mesmo não a conhecendo, tenho a certeza que viveu plenamente esses 49 anos que teve.

segunda-feira, março 24, 2008

Caramel: o Líbano no feminino


Pedro Almodóvar tem composto os retratos de mulheres - e das relações entre elas - mais tocantes e profundos do cinema contemporâneo. "Caramel", escrito, realizado e protagonizado Nadine Labaki, é uma obra que dialoga com a obra de Almodóvar. Nalguns dos seus mecanismos é quase telenovelesco, por vezes. Mas tem a qualidade de mostrar as mulheres nas suas várias circunstâncias. A mulher com vestígios de beleza e que rejeita uma felicidade em que não haja espaço para uma mãe frágil mental e fisicamente. A jovem mulher que ama outras mulheres. A que se entrega à volúpia nas suas mãos. A mulher que descobre o engano de um homem e que ainda assim quer acreditar nele e no amor dele. A mulher abandonada pelo marido e que, como algumas das mulheres do cineasta espanhol, lança mão das artimanhas femininas para fazer-se mais nova e continuar a sentir-se Mulher.
"Caramel" é ligeiro no tom e profundo no retrato que faz das suas mulheres doces.

domingo, março 16, 2008

Jean Rouch, Les tambours d'avant Tourou et Bitti

Iniciada a minha pesquisa sobre o memorial fílmico do colonialismo nas revistas cinematográficas do Estado Novo, retomo a obra de Jean Rouch (perdida desde outros tempos, outro contexto). Comovo-me com a beleza e a vibração desta cerimónia que comemora colheitas futuras. Fica o meu desejo de conseguir a simplicidade da abordagem de Rouch - passe a diferença das abordagens.

quarta-feira, fevereiro 13, 2008

terça-feira, fevereiro 12, 2008

Marjane Satrapi - Sobre o humanismo de "Persépolis"

É um dos grandes filmes do ano. Foi nomeado para o Óscar de Melhor Filme de Animação, o que é redutor. Não porque a animação seja um género menor mas porque este filme, que é por acaso um filme de animação, transcende a categoria do tipo de produção subjacente à sua criação. Trata-se da história da própria realizadora, Marjane Satrapi, que nos faz emocionar com ela e também se sabe rir de si própria e dos seus enganos. "Persépolis" transcende no entanto também a sua condição de obra autobiográfica para ousar aproximar-nos da realidade dos iranianos. Aumenta a realidade, aproxima-nos da cultura de um país, antigo, e revela como as vítimas são iguais em todo o mundo.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

Quatro meses, três semanas e dois dias

Estreou esta semana em Portugal um dos filmes mais interessantes dos últimos anos sobre a mulher e a sua circunstância. Trata-se de um filme sobre uma jovem que quer abortar na Roménia dos últimos anos do comunismo. Trata-se sobretudo de um filme sobre a comunhão de uma amiga, que partilha com aquela que quer abortar uma circunstãncia - um destino - comum. É a circunstância de muitas mulheres em todos os sítios do mundo.

Mas este não é um filme sobre o aborto. É antes uma obra sobre a fragilidade - uma fragilidade que perdura - da situação das mulheres no mundo. Uma fragilidade que é tanto maior quanto menor é a liberdade possível na sua circunstância. Nos países em guerra, nos países em que politicamente as mulheres não existem ou continuam a ser cidadãs de segunda, os problemas inerentes à sua condição de ser mulher agravam-se.
Belíssimo filme este de Christian Mungiu. Belíssimas interpretações - a de Anamaria Marinca sobretudo. E que extraordinária história de cumplicidade...
Porque o mais perturbador e interessante neste filme é fixar o drama acompanhando sobretudo os movimentos da amiga, Otilia. Dá outra dimensão à consciência sobre a situação da mulher. Não é uma visão de dentro embora seja implicada. É a visão e a sensibilidade de quem não se exime à situação porque poderia ser ela, poderia ser consigo. Esta compaixão - cada vez mais ausente das relações entre os homens e as mulheres - dá maior intensidade, universaliza de outro modo o drama. Não é aquela mulher mas todas as mulheres do mundo, diz-nos.