Estreou esta semana em Portugal um dos filmes mais interessantes dos últimos anos sobre a mulher e a sua circunstância. Trata-se de um filme sobre uma jovem que quer abortar na Roménia dos últimos anos do comunismo. Trata-se sobretudo de um filme sobre a comunhão de uma amiga, que partilha com aquela que quer abortar uma circunstãncia - um destino - comum. É a circunstância de muitas mulheres em todos os sítios do mundo.
Mas este não é um filme sobre o aborto. É antes uma obra sobre a fragilidade - uma fragilidade que perdura - da situação das mulheres no mundo. Uma fragilidade que é tanto maior quanto menor é a liberdade possível na sua circunstância. Nos países em guerra, nos países em que politicamente as mulheres não existem ou continuam a ser cidadãs de segunda, os problemas inerentes à sua condição de ser mulher agravam-se.
Belíssimo filme este de Christian Mungiu. Belíssimas interpretações - a de Anamaria Marinca sobretudo. E que extraordinária história de cumplicidade...
Porque o mais perturbador e interessante neste filme é fixar o drama acompanhando sobretudo os movimentos da amiga, Otilia. Dá outra dimensão à consciência sobre a situação da mulher. Não é uma visão de dentro embora seja implicada. É a visão e a sensibilidade de quem não se exime à situação porque poderia ser ela, poderia ser consigo. Esta compaixão - cada vez mais ausente das relações entre os homens e as mulheres - dá maior intensidade, universaliza de outro modo o drama. Não é aquela mulher mas todas as mulheres do mundo, diz-nos.